A solução está à vista

Gaudêncio Torquato, jornalista, professor titular da USP é consultor
político e de comunicação. Twitter: @gaudtorquato



Pesquisas recentes sinalizam: nunca a sociedade brasileira esteve tão de costas para a política. 84% não se sentem representados por nenhum partido; 64% acham que a melhoria da vida depende de si próprios, enquanto 45% confiam que só Deus resolverá. Essa é a moldura desenhada pelo Instituto Locomotiva. Entre os jovens, a descrença é maior: dois terços dos 8 milhões de universitários brasileiros não acreditam mais na política, enquanto 90% vêem o país no rumo errado. Porém, 80% acreditam que o voto pode mudar o destino da Nação. E por que não mudam a direção errada?

Uma das hipóteses é a de que poucos acreditam na mudança de rumos. Há convicção de que o vírus da corrupção está na veia dos brasileiros, sendo impossível sua extirpação. Esse vírus assume, em alguns momentos, o nome de "jeitinho brasileiro". A pesquisa mostra que 3% se consideravam corruptos, enquanto 6% admitiam já terem praticado corrupção. E de cada 10, 8 diziam ter falsificado carteira de estudante ou pago propina a guarda. Essa sensação de corrupção explica parte da descrença.

A lama em que se transformou a política tem funcionado para que cidadãos a evitem. A sujeira na imagem da classe política nivela por baixo seus protagonistas, deixando-os sem credibilidade. E os mesmos não agem para atrair os descrentes.

Como falar em renovação política sem os jovens? Alguns partidos criam frentes para abrigá-los, oferecem cursos de formação política, mas a adesão é pequena.

No passado, corria a certeza de que movimentações nas ruas geravam reações na política. Quando grupos organizados ocupavam os corredores do Congresso e movimentos de rua, como em 2013, protestavam, resultados apareciam. Hoje, essa movimentação é pífia e restrita a causas corporativas que defendem posições salariais e privilégios de categorias.

Os campos de expressão mudaram. As ruas são substituídas pelas redes sociais. Nos últimos 10 anos, 54 milhões de novos internautas passaram a usar as redes, dando fluxo a uma tendência com impactos na esfera política. Os atores do velho palco ainda não se tocaram para tal realidade. Perfis detestados pela mídia massiva começam a ser consagrados nas redes. Donde se deduz que interrogações rondam o mundo da política.

A partir da pesquisa, seu coordenador, o cientista Renato Meirelles, conclui que o país, ante a gravidade da crise, vive "caminho sem volta". Apenas um novo modelo para gerir a sociedade resolveria. Nesse ponto, não há como concordar com Meirelles. A solução está à vista.

O caminho passa pela reforma dos costumes políticos. Reduzir o número de partidos – de 35 para 6 ou 7 -, com a adoção da multiplicação de siglas; incorporação de doutrinas pelos partidos, a partir de propostas claras; adoção do sistema distrital misto de voto; exigência de disciplina e rigor nos padrões éticos de conduta; instalação do parlamentarismo de feição brasileira (repartição de funções entre Executivo e Legislativo); adoção de controle de abusos de autoridade; celeridade do Judiciário; sistema igualitário de previdência social, com extinção de privilégios; fim da querela entre Ministério Público e Polícia Federal sobre delação premiada; rígida aplicação da Lei de Responsabilidade Fiscal; proibição de candidatos ficha-sujas etc.

Se esses instrumentos fossem adotados, a política abriria nova era e as instituições funcionariam sob harmonia e eficiência. Não há como aceitar um país sem partidos. Não há como aceitar uma Nação que dê as costas à política. Qualquer solução para a melhoria da vida institucional passa pela política. Defender candidaturas sem a chancela partidária é abrir frestas ao autoritarismo e ao populismo. Seria louvar o individualismo. Fora "salvadores da Pátria", fora demagogos, fora quem aposta na divisão do território entre "nós e eles". Cuidado, muito cuidado, incautos.
 

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