Por que poucos alunos de escolas públicas de São Carlos estão na USP?

      Estudo realizado pelo ICMC em duas escolas mostra que adolescentes ainda não acreditam que podem cursar uma universidade pública

"É difícil". "Não tenho dinheiro". "Não tenho capacidade". "Prefiro fazer curso técnico". Essas afirmações são de estudantes de duas escolas públicas de São Carlos e mostram a percepção que eles têm da universidade. Realizada pelo Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação (ICMC) da USP, em São Carlos, a pesquisa demonstra que existe uma separação entre a universidade pública e o aluno do ensino básico gratuito.
       
A estudante Gabriela Dall'Agnol (foto), que faz Estatística no ICMC, ouviu, ao todo, 744 alunos do ensino médio – 423 da Escola Estadual Álvaro Guião e 321 da Escola Técnica Estadual (ETEC) Paulino Botelho. Orientada pela professora Cynthia Ferreira, Gabriela explica que um dos objetivos do projeto é apresentar aos estudantes as oportunidades existentes na USP: "Essas escolas estão próximas à faculdade, mas os alunos não estão aqui dentro. Temos que entender o porquê e trazer esse público para cá". Elas contaram com o apoio dos professores Mário de Castro e Juliana Cobre, do ICMC, para a elaboração dos questionários aplicados nas escolas.

Gabriela estou em escola pública e sabe das dificuldades enfrentadas pelos estudantes: "o principal ponto é que eles sabem que, quando saírem do ensino médio, vão ter que trabalhar. Então, fazer um curso diurno é inviável. Eles não sabem que podem ter auxílios ou bolsas. Alguns até acham que precisa pagar. Muitos acreditam que não têm capacidade de passar no vestibular". 

Para esclarecer que a USP é uma universidade gratuita, o ICMC produziu o vídeo Você sabe quanto custa estudar na USP?, destacando que até quem não tem recursos financeiros para estudar pode ter acesso a diversas oportunidades e conquistar um diploma.
Os resultados - A pesquisa indicou que a maioria dos estudantes da Álvaro Guião (66%) e da ETEC (82%) pretende fazer faculdade ao terminar o ensino médio. O estudo buscou, ainda, entender os motivos da falta de interesse daqueles que não almejam ir para o ensino superior. Foi então que surgiram as respostas: "é difícil"; "não tenho dinheiro"; "não tenho capacidade"; "prefiro fazer curso técnico". De acordo com Gabriela, essas afirmações demonstram como a falta de informação ainda é muito presente nas escolas da rede pública.        
 
Outro objetivo da pesquisa é identificar quanto os alunos da rede pública conhecem sobre a universidade – em especial sobre o ICMC e o curso de Estatística e o de Matemática Aplicada e Computação Científica. Entre as oito graduações oferecidas pelo Instituto, o trabalho analisou essas duas carreiras, que são as mais novas e com a menor relação candidato/vaga. Foi identificado que quase todos os alunos conhecem a USP em São Carlos, mas poucos sabem sobre os dois cursos em questão.

"Nós percebemos que o curso de Estatística é pouquíssimo conhecido pelos alunos, menos que Matemática Aplicada. Talvez porque, quando falamos de matemática, eles associam com a disciplina da escola, então é mais fácil. Mas estatística poucos sabem o que é", afirma Gabriela.

A falta de conhecimento é ainda maior sobre os campos de atuação das duas áreas. A maioria dos estudantes não sabe que um matemático aplicado pode atuar em, basicamente, qualquer área: indústrias, empresas de software, bancos ou centros de pesquisa, que se beneficiam do conhecimento desse profissional para solucionar problemas reais utilizando modelos matemáticos e computação.

        
Poucos também sabem que um estatístico pode atuar nas áreas de marketing, finanças, saúde e comunicação, por exemplo, transformando dados brutos em informações importantes para esses setores. Com o objetivo de possibilitar aos futuros universitários saber o que é ensinado em cada curso de graduação oferecido pelo ICMC e onde poderão trabalhar depois de formados, o Instituto disponibiliza o Guia Faça Parte do Futuro.

O Guia foi um dos materiais utilizados pelas pesquisadoras para levar informações a respeito do ICMC e da USP aos estudantes. Como parte do projeto foram realizadas, ainda, palestras e rodas de discussão com os alunos. "Nós levamos o professor Mário de Castro e ele falou um pouco sobre o que um estatístico faz, mostramos
alguns vídeos do ICMC e falamos sobre as bolsas. Quando fomos apresentar os resultados da pesquisa já levamos uma divulgação do ICMC para lá", explica Gabriela. O projeto da estudante foi reconhecido como um dos melhores trabalhos apresentados durante a VII Semana da Estatística, que aconteceu de 6 a 9 de junho, em São Carlos.          
 
"Como somos uma escola central, acreditamos que os alunos queiram estudar na USP ou pelo menos saibam o que tem lá. Eu estou há 12 anos na Álvaro Guião e me surpreendi com os resultados da pesquisa", diz a professora de matemática da escola, Maria Laura Trindade (foto). Segundo ela, o projeto foi muito benéfico para os estudantes: "isso é muito importante, porque a universidade parece uma coisa muito distante, eles acham que não vão conseguir passar no vestibular".

Ela acredita que o conteúdo dessa pesquisa vai ajudar a escola a entender melhor os estudantes: "Podemos identificar o perfil dos alunos e trabalhar no interesse deles pela Universidade". De acordo com a professora Cynthia, orientadora do projeto, entre os candidatos aprovados no vestibular, o número de jovens originários de São Carlos é bastante reduzido, comparado à quantidade de vagas oferecidas. Sendo assim, é importante despertar vocações e descobrir talentos entre os estudantes da região.            
 
A intenção de Cynthia é dar continuidade à análise e coleta de dados com alunos de ensino médio, pré-vestibulandos e ingressantes no ICMC: "pretendemos realizar uma série de pesquisas para entendermos desde como e onde o jovem busca informação, até o que os motiva a escolher uma determinada carreira". Os dados coletados servirão para subsidiar possíveis alterações nas grades curriculares dos cursos e contribuir com a divulgação das áreas de saber do ICMC. "Por meio da identificação das necessidades desse público, o Instituto será capaz de planejar ações estratégicas de marketing e comunicação para suprir essas demandas", conclui.
Texto e fotos: Alexandre Wolf - Assessoria de Comunicação do ICMC

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