A Páscoa que o Brasil necessita

Dom Reginaldo Andrietta, Bispo Diocesano de Jales

 
Aproximando-nos da Páscoa, convém refletirmos sobre seu sentido, especialmente para o Brasil de hoje. Muitos a associam aos ovos de chocolate. Seu sentido real, no entanto, é a libertação de tudo o que nos desumaniza. Por isso, a cada ano, durante a quaresma, a Igreja no Brasil realiza por meio da Campanha da Fraternidade, um amplo trabalho de conscientização sobre situações que afligem o povo brasileiro, visando ações que as transformem.

A Páscoa, originalmente celebrada pelos judeus como libertação da escravidão no Egito, passou a ser celebrada pelos cristãos como libertação de todo tipo de escravidão, finalmente, libertação da morte pela ressurreição de Cristo. Ao ressuscitar, Cristo abriu as portas para nossa ressurreição. Quem crê em Cristo vive como nova criatura. Celebrar sua ressurreição implica fazê-la acontecer em nossa vida pessoal e social.

Nossa caminhada quaresmal deste ano no Brasil, inspirada pelo tema da Campanha da Fraternidade, "Casa Comum: Nossa Responsabilidade", focada no saneamento básico, culmina na Páscoa, na qual celebramos o dom total de Jesus pela salvação da humanidade, dispondo-nos a doar, também, nossa vida por uma humanidade transformada, a começar por um país politicamente mais saudável.

Cremos em Deus encarnado na história humana. Por isso, entendemos que nossa fé orienta nossos projetos de vida em sociedade e inspira nossas ações para que o Reino de Deus inaugurado por Jesus se manifeste presente na realidade brasileira. "O Reino de Deus está entre vós" (Lc 17,21). O engajamento social da Igreja decorre dessa convicção. Por isso, a Igreja, particularmente no Brasil, afronta os problemas que afetam a vida em sociedade.

Quanto mais refletimos sobre esses problemas, mais nos conscientizamos sobre uma de suas principais causas: a perversidade de nosso sistema econômico. Ele concentra os meios de produção nas mãos de poucos, produz riquezas para uma minoria, mantém os trabalhadores em condições de precariedade, exclui do mercado de trabalho os jovens sem experiência e sem formação profissional especializada, descarta os trabalhadores com idade avançada, explora e destrói de maneira inescrupulosa o meio ambiente.

Com a Campanha da Fraternidade deste ano, tornamo-nos mais convencidos sobre a necessidade de transformar este sistema. Diante de muito por fazer, a Igreja entende que é urgente criar estruturas que consolidem uma ordem social, econômica e política na qual não haja iniquidades. Essa nova ordem supõe, muito além da ética pessoal dos governantes, mudanças na forma de elegê-los e de governar.

Por isso, a Igreja no Brasil nos convida nesta Páscoa, a um engajamento em prol de uma ampla reforma política que implique mudanças nas regras eleitorais, sobretudo no tocante ao financiamento de campanhas eleitorais. O avanço da democracia, de representativa a participativa, é o objetivo último da reforma política que continua a ser defendida pela Igreja neste país. Devemos, sim, ocupar ruas e praças para dar evidência a essa luta.

A Páscoa que ansiamos celebrar no Brasil só terá sentido se for acompanhada por ações que transformem radicalmente a cultura e organização política deste país. Que o tempo pascal que se aproxima, seja, pois, um tempo para renovar nossa esperança. Cristo venceu mecanismos de opressão e a própria morte. Com Ele, seremos também vitoriosos. Basta crermos e continuarmos nossa luta com coragem e sabedoria política.
 

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