Moral vigente

por Reginaldo Villazón

 
A moral da sociedade contemporânea tem recebido a atenção de vários pensadores. Há motivos de sobra para que eles busquem compreender os valores e os comportamentos morais vigentes na atualidade, pois é muito perceptível que nas últimas décadas aconteceram mudanças sociais profundas e irreversíveis que transformaram a sociedade. À primeira vista, a moral só evoluiu. Hoje, muitas atitudes erradas são reprovadas e condenadas, como a discriminação racial, a aversão aos homossexuais, a opressão contra as mulheres.

Mas nesta época, em que é preciso até tomar cuidado ao falar – para não transgredir a linguagem politicamente correta –, sentimos o desconforto e a desconfiança com intensidades suficientes para nos fazer crer que a sociedade atual esteja mal. Então, observamos as notícias que recebemos diariamente. Imoralidades na política, nas instituições oficiais, nas empresas estatais e privadas, nas instituições esportivas. Homens públicos, empresários e advogados tratam com leviandade assuntos de natureza grave.

Constatamos que os males sociais produzidos pelo homem contemporâneo não estão confinados em países típicos, em áreas urbanas conhecidas, em classes sociais específicas. Eles estão por toda parte e muito perto de nós. Seus personagens não são indivíduos mal encarados e inclinados à maldade, mas os cidadãos comuns que formam a sociedade. E nós fazemos parte dessa experiência coletiva, ainda que de modo inconsciente. Talvez, a causa mais relevante desse cenário seja a loucura do capitalismo antes do seu inevitável fim.

Mas seria imperdoável ignorar as análises de Zygmunt Baumam – o inspirado sociólogo polonês fixado no Reino Unido –, lúcido aos 90 anos. Ele toma por base o organismo humano, que sente dor, mas é anestesiado quando necessário. Todavia, a dor não pode ser suspensa para sempre. A dor é necessária para a manutenção da saúde e do bem-estar. Pois o organismo social contemporâneo vive uma "insensibilidade moral", uma postura anestesiada de indiferença, de apatia em relação aos problemas que afetam os outros e a própria sociedade.

Não faltam justificativas para essa tolerância sem limites. A escassez de recursos públicos justifica os acidentes em estradas mal conservadas. O combate aos radicais islâmicos justifica os bombardeios em organizações civis humanitárias. A liberdade de expressão justifica a exposição pública da vida privada de quem deseja viver em paz. As leis e convenções democráticas justificam a exploração de uns sobre outros. Entorpecida pelo ópio do progresso material, a sociedade tudo vê, ouve e aceita com resignação.

A vida em comunidade pode ser rica e agradável. As relações solidárias e os sentimentos não podem dar lugar à insensibilidade da cultura do consumo. O mal social se manifesta sempre que deixamos de reagir ao sofrimento alheio, ainda que nossas crenças filosóficas e religiosas nos absolvam. A solução é a busca da sensibilidade, o uso de antigas práticas de reação e novas práticas de manifestação para criar condições saudáveis de compreensão e colaboração. Essa tarefa individual e intransferível não permite alegações contrárias.

Comentários