O Quinze, por Reginaldo Villazón


Rachel de Queiroz (1910 – 2003) foi uma estrela de primeira grandeza no céu da cultura brasileira. Foi escritora, dramaturga, tradutora, cronista e jornalista. Produziu extensa obra e recebeu muitos prêmios. Foi a primeira mulher a ingressar na Academia Brasileira de Letras. Foi ela quem escreveu os diálogos do filme "O Cangaceiro" (1953), premiado no Festival de Cannes (França) e aclamado em mais de 80 países. Seu romance "Memorial de Maria Moura" (1992) virou minissérie na TV Globo, fez sucesso aqui e no exterior.
Em 1910, Rachel de Queiroz nasceu em Fortaleza, capital do Ceará. Em 1917, por causa dos efeitos da seca de 1915, mudou-se com a família para o Rio de Janeiro e depois Belém do Pará, mas retornou dois anos depois. Formou-se professora aos 15 anos de idade. Passou a publicar crônicas e poemas no jornal O Ceará. Seu primeiro romance – "A história de um nome" –, foi impresso modestamente na forma de folhetim. Em 1930, aos vinte anos, ganhou destaque nacional ao publicar seu primeiro romance na forma de livro: "O Quinze".
"O Quinze" tem como cenário a trágica seca de 1915. Naquele ano, em vez de chover em torno de 800 mm (litros por metro quadrado) no Estado do Ceará, suficientes para assegurar um ano normal de chuvas, choveu apenas 200 mm, como acontece nos desertos. Um ano de seca bastou para o Estado entrar em colapso, pois só dispunha de um grande reservatório de água, o Açude do Cedro, no Município de Quixadá. A situação só começou a se normalizar em dezembro, quando as chuvas voltaram a cair.
No romance, Rachel de Queiroz conta duas histórias paralelas. O amor indeciso de um jovem casal e a fuga da seca de uma família. Ela descreve as agruras impostas pela seca. Porém, os relatos verídicos dessa seca são muito piores. A vegetação rasteira desaparece, os animais morrem, as pessoas definham. Para proteger a capital de invasores famintos, o governo criou na proximidade um campo de concentração – um quadrado cercado de 500 por 500 metros –, que chegou a conter 8.000 pessoas em condições de vida pavorosas.
Faz cem anos que isto aconteceu. Hoje, as chuvas perdem a regularidade no país. Na região sudeste (mais rica e populosa do país), onde está o Estado de São Paulo, a estiagem é preocupante. A escassez de chuvas não se iguala à dos desertos. Mas, entra-se em 2015 com os níveis dos reservatórios baixos, podendo haver racionamento de água tratada e energia elétrica. Além dos transtornos à população, a produção industrial poderá diminuir e encarecer. É mês de fevereiro e tem-se quase o ano inteiro pela frente.
Os conhecimentos sobre o clima, as tecnologias de produção de água potável e os recursos financeiros são muito maiores hoje do que há cem anos. Mas o descaso dos políticos com povo e a negligência do povo com o meio ambiente continuam inconcebíveis. Aos poucos, as pessoas começam a acreditar que precisam adotar novos comportamentos. Começam a ver que novas atitudes podem render bons resultados. Talvez esta seja a única maneira de se preparar para evitar as tragédias anunciadas em larga escala.

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