SÃO PAULO É O PRIMEIRO ESTADO A CONTABILIZAR CRIMES COMETIDOS CONTRA PESSOAS COM DEFICIÊNCIA

O Estado de São Paulo é o primeiro do país a incluir no Registro Digital de Ocorrências (RDO) policial um campo para identificar se a vítima tem algum tipo de deficiência. Entre junho e agosto de 2014 foram registradas em todo o estado 4.452 ocorrências envolvendo 4.502 vítimas com deficiência. Este número, obtido em apenas três meses, corresponde à metade das 8 mil denúncias registradas pelo Disque 100 entre os anos de 2011 e meados de 2014.
As estatísticas foram produzidas pela equipe da 1ª Delegacia de Polícia da Pessoa com Deficiência e serão apresentadas na abertura do Seminário Estadual: Enfrentamento da Violência contra Pessoas com Deficiência, dias 27 e 28 de novembro, no auditório da Secretaria de Estado dos Direitos da Pessoa com Deficiência, no Memorial da América Latina – Portão 10.
 A maior parte das ocorrências do período considerado – cerca de 26% – foi registrada na capital. Os municípios da Grande São Paulo são responsáveis por aproximadamente 17% dos casos registrados. No interior, surgem com destaque Ribeirão Preto (2,5%) e Campinas (2%)
A distribuição das vítimas segundo o tipo de deficiência revelou que 46,5% dos casos envolviam vítimas com deficiência física, 19,1% deficiência intelectual, 15% visual, 12,6% auditiva e 6,6% deficiência múltipla.
Chama atenção o fato de a violência aparentemente não acompanhar a distribuição demográfica desse grupo social. Afinal, segundo os dados do IBGE, o tipo mais comum de deficiência em São Paulo (59,7%) é a visual. Além disso, as pessoas com deficiência intelectual aparecem em proporção menor nos dados do Censo 2010 (4,1%), mas surgem como o segundo grupo mais presente nas informações dos RDOs.
Entre os 4.452 registros, 33,7% referem-se a crimes contra a pessoa; 31% a crimes contra o patrimônio; 5% a violência doméstica; 3% a contravenções e 2% a crimes contra a dignidade sexual. Se consideradas apenas as rubricas classificadas como de natureza criminal, as de maior incidência são ameaça, furto, roubo, lesão corporal, injúria, violência doméstica e estelionato.
Na categoria de crimes contra a pessoa, a maior incidência foi de casos de crimes contra a liberdade individual (39,3%), lesões corporais (29.8%) e crimes contra a honra (24,3%). Estes números apresentam padrão diverso dos dados gerais da população publicados pela SSP.
Os crimes contra o patrimônio correspondem à maior parte dos delitos praticados contra a população como um todo, enquanto no recorte da deficiência prevalecem os crimes contra a pessoa. Já os crimes contra a dignidade sexual, que representam menos de 1% dos delitos contabilizados pela SSP no segundo trimestre de 2014, na amostra aqui analisada correspondem a 2,07% dos registros.
 Tipos de crime X tipos de deficiência
Crimes contra o patrimônio – tais como furto, roubo e apropriação indébita – afetam mais as vítimas com deficiência auditiva (42%) do que a média do universo aqui considerado, em que estes crimes correspondem a pouco mais de 31% do total. Proporcionalmente, as pessoas com deficiência auditiva também são mais alvo de crimes de trânsito (4,7%) do que a média geral.
 No caso da deficiência física, chama a atenção a proporção de crimes contra a dignidade sexual, menor do que a verificada para o total das vítimas e para os demais tipos de deficiência. Já os crimes contra a pessoa aparecem em proporção levemente superior à verificada para a totalidade das vítimas.
Entre as vítimas com deficiência intelectual, destaca-se a proporção de crimes contra a dignidade sexual (8%), quando na média de todas as deficiências manteve-se em 2,07%. Os registros de ocorrências não criminais também aparecem aqui em proporção maior do que nos registros referentes a todas as deficiências.
Verificou-se ainda que a proporção de crimes contra o patrimônio cometidos contra vítimas com deficiência visual (40,7%) é maior do que a do universo analisado do período (31,02%).
 Perfil das vítimas
 Quanto ao perfil das vítimas, 65% são adultos acima de 40 anos. O grau de instrução não aparece como um diferencial, pois 52,2% das vítimas tinham 1º ou 2º grau completo, 6,3% tinham ensino superior completo e só 9,4% eram analfabetos.
 Subnotificação
 A ideia de inserir um campo específico nos boletins de ocorrência integra a agenda do Programa Estadual de Prevenção e Combate à Violência contra as Pessoas com Deficiência e foi considerada estratégica para conhecer o real tamanho do problema e estabelecer ações de enfrentamento.
No novo RDO da polícia de São Paulo, a pessoa que presta queixa informa se tem alguma deficiência e de qual tipo, sem necessidade de qualquer comprovação no momento. Nem todos os crimes registrados têm relação direta com a deficiência, mas essas informações serão úteis sobretudo para avaliar vulnerabilidades e traçar políticas de prevenção.
É importante ressaltar que, apesar da importância da implantação do campo específico nos RDOs do estado de São Paulo, esses dados não representam a totalidade dos casos de violência contra pessoa com deficiência, já que em muitos casos a vítima não consegue reportar as agressões sofridas, seja por dificuldades de locomoção e comunicação – particularmente pessoas com deficiência auditiva ou intelectual – ou por medo, devido à proximidade ou até dependência do agressor, o que implica em uma subnotificação dos casos.
 Seminário
 Além das estatísticas policiais, o Seminário Estadual: Enfrentamento da Violência contra Pessoas com Deficiência vai abordar aspectos não criminais da violência, como a necessidade de capacitar os servidores públicos para identificar e encaminhar os casos; a importância de oferecer apoio ao cuidador, evitando que o estresse desencadeie episódios de violência; e a urgência de se investir em programas de moradia que atendam pessoas em situação de vulnerabilidade social ou rompimento dos laços familiares.

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