Turbinar a justiça criminal, por José Renato Nalini

 
Um dos pontos frágeis do sistema de Justiça é o seu braço criminal. O crime é um fenômeno que assusta, amedronta, aterroriza. Uma das maiores preocupações contemporâneas é a de se defrontar com alguém destituído de escrúpulos, que não ouse em tirar a vida do próximo por quase nada. A trivialidade da vida é um fator de intranquilidade permanente. Consequência não só da acelerada urbanização, mas – principalmente – da perda dos valores. Esgarçamento da família, crise da escola e da religião.
O resultado dessa paranoia é a multiplicação de presídios, na ingênua crença de que a segregação resolve os complexos problemas da criminalidade. A população ainda se revolta quando vê tardar a punição ou quando, por motivos técnicos, vê devolvidos ao convívio aqueles infratores que ela gostaria de ver permanentemente encarcerados.
O sistema de Justiça Penal no Brasil não colabora para devolver a confiança abalada. Porque, em regra, a apuração das práticas penais tem início num BO – Boletim de Ocorrência, do qual às vezes resulta um IP – Inquérito Policial. Poucos inquéritos geram uma denúncia. Nem todas as denúncias resultam em condenação.
Algo que poderia ser enfrentado pelo Parlamento seria a adoção do Juizado de Instrução. Porque o inquérito policial não é suficiente a formar a convicção do juiz. Ele precisa repetir na Vara Criminal toda a instrução já desenvolvida na delegacia de polícia, na fase inquisitiva.
O juizado de instrução, realizado de forma a propiciar a defesa a arguição de todos os seus argumentos, a oferta de resistência consistente à acusação, pouparia a repetição da coleta da prova e bastaria ao juiz da causa sentenciar, com base na apuração contida na peça policial.
Outra providência que tarda a ser adotada é a informatização da Polícia Civil. Se os inquéritos, ainda que mantido o atual procedimento, fossem eletrônicos, a Justiça Paulista poderia também adotar idêntico parâmetro para a esfera criminal. Enquanto a Justiça Civil caminha gradualmente para integral informatização, a Justiça Penal esbarra no inquérito de papel, o que apenas intensifica a sensação de disfuncionalidade e ineficiência.
São duas ideias que a sociedade precisaria debater e encarar com seriedade, se pretende mudar o atual panorama de crescente desalento em relação à eficácia de seu sistema penal. *José Renato Nalini é presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo.

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