Sem sintonia, por Reginaldo Villazón

Passado um ano inteiro, os ecos das manifestações populares de junho de 2013 ainda estão no ar. Mas a Copa do Mundo, duramente criticada naquelas manifestações, está se realizando de acordo com os planos da FIFA e do governo brasileiro. Claro, com alguns problemas: vaias à presidente Dilma Rousseff no jogo de abertura, presença discreta do presidente da FIFA em alguns jogos, uso de 12 estádios novos superfaturados, muitos agentes de segurança dentro dos estádios e tropas de choque nas ruas.

Apesar da desaprovação de 40% e indiferença de 10% da população, quem apostou que a Copa do Mundo iria acontecer acertou. E quem apostou que haveria manifestações durante o evento também acertou. Quem errou? Errou quem acreditou que as manifestações populares – que reivindicavam melhoramentos na mobilidade urbana, segurança, educação e saúde, e combate à corrupção – perderam sua força e cederam lugar às ações violentas dos baderneiros contra empresas privadas, benfeitorias públicas e veículos coletivos.

De verdade, o país mudou. O país não é o mesmo, depois das manifestações populares de junho de 2013. Naquela ocasião, o movimento dos estudantes em favor do "passe livre" nos transportes públicos em algumas capitais ampliou suas fileiras e suas reivindicações. Denunciou o mau uso político e econômico da Copa do Mundo e expandiu suas passeatas para centenas de cidades. Embora os políticos e governantes não tenham tomado atitudes práticas a respeito, o conteúdo das reivindicações está vivo na consciência da população.

As vaias à presidente Dilma Rousseff dentro da Arena Corinthians e os 21 protestos de rua registrados pela mídia na primeira semana da Copa são provas de que hoje é real a falta de sintonia entre o sistema político-administrativo do país e o povo. Não aconteceu uma ruptura entre o povo e a presidente, nem entre o povo e o Partido dos Trabalhadores (PT). Simplesmente, o sistema político-administrativo não consegue responder às demandas sociais, independentemente das diferentes agremiações partidárias e pessoas públicas.

Numa cerimônia de troca de ministros, em março deste ano, em que atendeu pedidos do PMDB e do PDT, a presidente Dilma declarou que a mudança tinha o sentido de coalizão para permitir a governabilidade. Ora, se governabilidade deve ser entendida como a capacidade de identificar necessidades e anseios sociais para transformá-los em políticas públicas efetivas, qual o valor dessas uniões partidárias desprovidas de um programa de trabalho vinculado aos movimentos legítimos da sociedade democrática?

O Brasil tem muitos problemas a enfrentar, começando por reformas na política, na administração pública e na arrecadação de impostos. As questões relativas ao meio ambiente são cruciais para a vida nas cidades: arborização, obtenção e uso de água encanada e energia elétrica, reciclagem do lixo, controle da poluição. No campo: estrutura agrária, biodiversidade natural e agricultura sustentável. O povo brasileiro tem, sim, o poder de mudar a política e mudar o país. Seu poder está na força que começa dentro dele, na sua consciência.

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