Símbolos da semana

D. Demétrio Valentini

 
As primeiras páginas da Bíblia estão repletas de símbolos. Eles desafiam nossa inteligência. E nos mantêm alertas para perceber novos significados que possam abrigar por trás da ousadia de seus símbolos.
Os primeiros onze capítulos do Livro do Gênesis não são relatos históricos. São textos simbólicos. Lançam mão da estratégia de usar cenas com aparências históricas, para expressar situações amplas e permanentes.
Por exemplo, a "história" de Caim matando o seu irmão Abel, infelizmente não se reduz a um episódio isolado, que a Bíblia registra. Porque na verdade é uma cena simbólica, mostrando quanto a humanidade continua impregnada de sentimentos negativos que levam os irmãos a se matarem entre si.
Da mesma maneira, é simbólica a "história" do dilúvio que cobriu toda a terra, ou a "história" da torre de Babel. Usam um gênero literário parecido com as "parábolas", que Jesus contava com maestria.
Seria muito cômodo reduzir estes relatos à sua aparência concreta. O desafio é interpretar o seu significado, que é sempre mais amplo do que sugere sua fisionomia externa.
O relato da criação do mundo dentro dos moldes de uma "semana", foi o objeto preferido das apressadas acusações contra a Bíblia. Hoje a semântica reconhece que este relato faz parte das mais famosas páginas que a literatura mundial já registrou.
Entre tantos símbolos, usados neste relato da criação do mundo que a Bíblia apresenta, o símbolo da semana continua sendo o mais rico, e o mais valorizado pela liturgia.
Para a Bíblia, a semana é a medida simbólica da totalidade do universo. Desde a sua primeira página, apresenta o mundo ritmado na sequência de sete dias, expressando a perfeição do projeto divino e sua realização harmoniosa na natureza.
Daí nasce a força simbólica da semana. Na linguagem bíblica, ela é a medida do universo, e a expressão dos desígnios originais de Deus, o Criador.
Cristo veio retomar estes desígnios, e refazê-los com a nova medida da misericórdia divina, que assimila as consequências do pecado, e reintegra a humanidade em seu mistério de amor.
A ação de Deus, na primeira criação, é colocada no contexto da semana. A "nova criação", realizada por Cristo, também é colocada na sequência de uma semana.
A primeira semana, da criação do mundo, revela o poder de Deus, que faz tudo acontecer sob o comando de sua palavra.
A segunda semana, também revela o poder de Deus. Mas um poder diferente, que surpreende a humanidade. O poder da misericórdia, que assume a forma de fraqueza humana, manifestada pela humilhação do Cristo que aceita o sofrimento e a morte, frutos do pecado, para vencê-los com a força do amor. 
A semana da criação revela a eficácia da Palavra criadora, que ordena e tudo acontece. A semana da redenção manifesta a fecundidade da obediência de Cristo, que aceita o cálice amargo, e por meio dele redime a humanidade e faz acontecer o "homem novo", que manifesta todo o seu vigor na glória do Ressuscitado.
Após 40 anos, o povo entrou na terra prometida. Após os quarenta dias da quaresma, somos convidados a entrar no mistério de Cristo, que nos torna novas criaturas, pela força do seu amor redentor.
 

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