Arte popular

Reginaldo Villazón

O carnaval de 2014 chegou simplesmente, sem expectativas, sem manifestações de contentamento ou contrariedade. Mas, para surpresa de muita gente, foi um grande carnaval em todo o país. Os dias destinados ao carnaval são feriados e pontos facultativos. Por isto, os cidadãos brasileiros são livres para utilizar este período. Cada um escolhe – trabalhar, sambar, descansar ou viajar – de acordo com o seu desejo ou a sua necessidade. Foi assim, em clima de alegria e paz, que o Brasil teve um excelente carnaval em 2014.

A imprensa acompanhou e divulgou o ótimo carnaval das cidades fortes no evento, como Rio de Janeiro, São Paulo, Salvador, Recife, Olinda. Mostrou, também, a festa organizada e colorida de milhares de foliões nas praças, avenidas e ruas de muitas outras cidades. Se o povo brasileiro fosse menos expansivo, seria normal esperar que o seu ânimo para o carnaval fosse prejudicado pelas adversidades, entre elas a violência. Isto não aconteceu. Aos olhos dos turistas estrangeiros, os brasileiros não têm problemas.

No Rio de Janeiro e São Paulo, as escolas de samba esbanjaram competência, cultura, criatividade e beleza. Tudo perfeito, da fantasia dos desfilantes à imponência dos carros alegóricos. As escolas exibiram milhares de componentes, organizados de forma complexa. A comissão de frente, o carro abre-alas, as alas de sambistas, o mestre-sala, a porta-bandeira, a bateria e muito mais. No Rio de Janeiro, entre as 12 escolas do grupo de elite, ganhou a Unidos da Tijuca. Em São Paulo, entre as 14 escolas, ganhou a Mocidade Alegre.

O custo da preparação das escolas de samba é contado em milhões. São várias as fontes dos recursos: festas, rodas de samba, verbas oficiais, patrocínios de empresas, direitos de transmissão dos desfiles. O que causa admiração é a capacidade de pessoas simples (na maioria, moradoras em favelas) em realizar uma festa popular de tamanha expressão. Pois, nela está a eficiência dos gestores, a genialidade dos desenhistas, a habilidade dos artesãos, a inspiração dos compositores, a competência dos músicos, cantores e dançarinos.

Em menor escala, esta capacidade de empreender e fazer arte também está em Recife, Olinda e Brasil afora, nos blocos, cordões, bandas e trios elétricos. Melhor será dizer que a arte popular – no carnaval e além dele – é uma riqueza que há em todo o país e está nas mãos de gente humilde e competente. A música, a poesia, a dança, a pintura, as obras feitas de barro e madeira, os utensílios feitos de palha e tecidos, são exemplos da rica arte popular brasileira, que não tem origem em universidades nem sede em salões oficiais.

Percebe-se que é um erro considerar o povo sem qualidade para pensar e agir com eficiência e criatividade. Muitas vezes, as tentativas oficiais de levar o desenvolvimento às comunidades falham por conceber soluções técnicas medíocres. Não existe povo completamente ignorante, sem uma sabedoria. Por isto, o carnaval e outras artes populares vão continuar vivos, ainda que sejam pouco prestigiados pelas autoridades. Vai haver sempre boas surpresas, quando o povo decidido e alegre externa a beleza que tem na alma.

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